Capítulo 1 - What The Fuck?
- Como é? – levantei-me da cadeira praticamente em choque com a notícia.
- Sim, é. Seus olhos estão azuis, que estranho – Víctor falou como se aquilo fosse uma coisa totalmente normal para ele.
- MAS NÃO É! OS OLHOS DAS PESSOAS NÃO MUDAM DE COR DE REPENTE! – quando fiz isso, todos os rostos se viraram para mim como se eu tivesse acabado de cometer um crime contra o Papa.
Meus três amigos: Earl, Lisa e Gerald me olharam com uma cara diferente dos outros. Isso me fez ir ao professor e falei coçando os olhos para que ele não visse nada:
- Com licença, posso ir ao banheiro?
- Sim, pode.
Virei-me e empurrei a porta com toda a força que eu tinha, dei 10 passos pelo corredor pequeno e aberto e quando fiz a curva para dirigir-me para a escada, minhas mãos começaram a arder também. Levantei o rosto e vi a rua do lado de fora do colégio, uma velha árvore tinha suas folhas balançadas pelo vento e uma delas se soltou, percebi seu movimento e as preocupações de minha mente sumiram. Eu a vi dando pequenas cambalhotas e ficando clara conforme o Sol da tarde a iluminava, ela deu um rodopio singelo e veio em minha direção. Eu estendi a mão direita para pegá-la e quando o fiz, a folha automaticamente começou a pegar fogo. Larguei-a e esperei que ela sumisse nas cinzas. Olhei para todos os lados e como não vi ninguém que mantinha os olhos em mim, desci as escadas correndo indo em direção ao banheiro.
Quando cheguei, um cheiro forte de desinfetante barato entrou em minhas narinas. Fiquei indignado por pagar uma fortuna de colégio e não ter um desinfetante que prestasse para limpar o banheiro. Fui até a pia afogado em meu descontentamento e abri a torneira, assim que coloquei as mãos embaixo da água uma fumaça saiu delas, isso só significava que a água virou vapor devido à temperatura muito alta em que minhas mãos se encontravam. Comecei a ficar nervoso com a questão e fechei a torneira. Saí correndo para o espelho emoldurado em madeira antiga para olhar minhas mãos. Pareciam absolutamente normais. Levantei-as na direção do rosto e relutei ao tentar tocá-lo. E se eu me queimasse? Qual explicação eu daria? Resolvi me arriscar, fechei os olhos esperando que a mão fosse inofensiva ao toque e encostei. Senti os dedos pressionando minha bochecha direita e nada mais. Esperei que meu rosto começasse a ferver. Não foi o que aconteceu. Voltei para a pia de Mármore e abri a torneira de novo e quando coloquei as mãos embaixo a fumaça de choque térmico veio de novo. Fechei a torneira e saí correndo e me sentei nas escadas do lado do banheiro. Quando coloquei minhas mãos no chão senti um alívio tremendo. Elas estavam frias e minhas mãos pararam de arder. Em menos de um minuto eu me levantei e voltei para a sala, uma rajada de vento bem reconfortante veio em meu rosto. Senti-me aliviado com aquela sensação e resolvi voltar correndo para a sala. Dei passos largos e meus tênis faziam um barulho engraçado quando batiam no chão. Virei a antiga árvore que estava no colégio há muito tempo e continuei a corrida, quando me aproximei da escada, não sei de onde surgiu uma senhora andando com uma garotinha com mochila rosa, só consegui perceber esses detalhes pois eu ia na direção das duas. Quando eu pensei que ia matá-las por me jogar em cima delas, automaticamente como um reflexo eu desviei com um salto mortal e caí atrás das duas que me olharam como se eu fosse um alienígena. Minha resposta foi rápida:
- Fazer ginástica dá nisso! – e continuei correndo espantado com o que eu havia feito.
Dei outra curva e de longe eu já vi a escada da informática. Se eu andasse 20 passos em linha reta eu estaria na escada. Resolvi tentar de novo o salto que eu havia dado da outra vez com a velhinha. Fiquei de frente para a escada e saí correndo na direção dos bancos, impulsionei meu corpo para frente e dei o mesmo salto de antes caindo em cima do banco, continuei a corrida e consegui andar na parede com uma facilidade incrível e finalizei com uma cambalhota que me deixou de frente para o corrimão verde-musgo. Quando subi as escadas alegre para retornar à aula, olhei para trás e vi a velhinha e a garota com uma cara que eu nunca conseguiria descrever em toda minha vida. Continuei a subir, mas agora fiz isso subindo de dois em dois degraus e logo senti o ar gelado em meu corpo quando abri a porta da sala de xadrez, porém, quase fui jogado pra fora, pois todos os alunos estavam saindo com suas mochilas e conversavam assuntos que considero “Uma Bela Porcaria”. Entrei na sala e meu amigo Earl estava com minha mochila preta nas mãos, Earl sempre foi o fortão de nós, lutava e tudo mais e todas as garotas iam atrás dele, o que o fazia ficar doido de felicidade. Ele era meio moreno e tinha o cabelo preto curto e espetado, assim que coloquei a mochila nas costas vi a fumaça saindo de minhas mãos. Earl olhou para mim acompanhado de Gerald. Lisa ficou pra trás falando com o professor. Como os dois não falavam nada eu resolvi explicar logo de uma vez, pois uma promessa que nós quatro tínhamos um com o outro era nunca esconder nada, ainda mais algo que com certeza precisaria de ajuda:
- Não sei o que é, mas quando eu estava indo ao banheiro segurei uma folha com as duas mãos e a folha virou cinzas – falei e olhei para os dois que ficaram pensativos.
- Foi só isso mesmo? – Gerald, um jovem meio fofinho para sua idade, outro grande amigo meu falou.
- Não, eu fui pro banheiro jogar água nas mãos para ver se a ardência que se seguia passava. Quando coloquei as mãos sobre a torneira, vapor saiu delas – comecei a descer as escadas com uma brisa suave que fazia meus curtos cabelos balançarem.
Earl e Gerald ficaram ao meu lado e Lisa também se juntou a conversa, enquanto Earl explicava pra ela o que eu falei, Gerald ficou ao meu lado e continuou a falar:
- Então foi só isso mesmo?
- Não, eu também... – não quis terminar a frase. Víctor surgiu do meu lado como um fantasma esboçando um sorriso meio estranho.
- Ahn, desculpe por ter ficado tanto tempo fora da sala de aula. Eu, - pigarreei – não estava me sentindo muito bem.
Assim que eu disse aquelas palavras percebi que eu havia ficado muito tempo fora da sala, tempo demais para o que eu achava. Pelas minhas contas, todas as minhas, digamos, “aventuras” haviam durado nada mais do que cinco minutos.
- Não está bem? O que está sentindo? – ele falou.
- Nada demais, só... Uma dor de cabeça – resolvi mentir, não sei por que raios fiz isso.
- Hum, bem. Eu vou falar com a coordenadora e encontro vocês na sala tudo bem? – ele falou e mal esperou resposta.
Caminhamos até chegarmos às escadas de mármore que levavam às salas, as mesmas das quais eu me sentei quando saí do banheiro. Virei-me para os três e falei:
- Gente, vão subindo. Eu vou jogar uma água no rosto e já encontro vocês – entrei sem nem esperar reações positivas ou adversas.
Assim que dei dois passos, as paredes brancas pareceram se embaraçar de tal jeito que eu não consegui entender. Tateei por elas até encontrar a abertura que levava para a segunda parte onde havia as pias também de mármore. Abri a torneira e joguei uma porção de água no rosto. Afoguei meus pensamentos em minha mente e fechei a torneira em uma volta só e com a mão direita no rosto secando-o saí do banheiro sem nem prestar atenção no que eu fazia. Quando saí, eu abaixei a mão do rosto e me segurei para não dar um berro de profundo espanto.
Víctor se encontrava encostado na escada com o mesmo sorriso de antes. Hesitei em sair do banheiro, mas eu não podia ficar ali o dia todo então saí na maior cara de pau sem falar com ele e subi as escadas. Obviamente ele me seguiu e ficou do meu lado e começou a falar:
- Ai, o colégio é bom a meu ver, pena que cheguei um mês atrasado – ele fez uma cara meio triste.
- Entendo, eu estudo aqui há tanto tempo que nem me preocupo mais com a qualidade – quando falei isso meus olhos voltaram a arder.
- Tá tudo bem? – ele perguntou e encostei-me à parede ladrilhada bege meio gelada.
- Sim, tá – falei sem olhar diretamente para ele.
- Tem certeza? Não quer nada mesmo? – ele falou e colocou a mão sobre meu ombro.
- Sim, tá. Vai subir antes que você tome uma bronca logo no primeiro dia aqui – saí debaixo do braço dele.
Assim que fiz isso peguei com a ponta do olho algo vindo em minha direção, quando me virei minha amiga que era um ano abaixo do meu, Andy, namorada de Earl, ela me abraçou e Víctor encostou-se à escada, sério:
- Oi, nem nos falamos de manhã! Tudo bem? – ela me abraçou de novo e trocamos dois beijinhos na bochecha.
- Ahn, não vai me apresentar? – Andy se virou para Víctor que rapidamente saiu de algum pensamento distante e voltou a atenção para nós.
- Andy, Víctor. Víctor, Andy – Andy sempre foi muito comunicativa e aberta a todos, mas o cumprimentou apenas com um aperto de mão. Resolvi mudar o clima de tensão que se formou rapidamente.
- Andy, eu queria lhe falar uma coisinha sobre o Earl que ele me falou ontem pelo MSN – desci dois degraus e Andy me seguiu e ficou do meu lado. Víctor ficou parado no meio da escada como se estivesse esperando algo.
- Víctor, faz um favor pra mim? Poderia marcar meu lugar lá na mesma cadeira onde eu estava sentado quando você entrou na sala? – estiquei a mochila pra ele que pegou com uma expressão severa no rosto e dei as costas para ele e saí correndo com Andy pelo pátio.
- E aí, tudo bem? – ela falou e riu.
- Ah, não estou muito bem agora não, estou meio que passando mal – minhas palavras demonstraram desconfiança em relação pra minha amiga.
- Sério? Quer ir à enfermaria? Eu te levo lá – ela falou já saindo me arrastando.
Eu levantei o braço e saí do aperto dela na minha mão e falei:
- Tá tudo bem, daqui a pouco eu melhoro – senti sede – vamos beber água?
- Sim, vamos – ela falou e foi andando do meu lado.
Chegamos aos bebedouros e ela bebeu no maior que estava com a pintura bege meio desgastada no canto direito, eu fui ao menor que havia acabado de ser reformado.
- Sabe Oliver, eu queria falar com você sobre o Earl sabe, ele...
Interrompi:
- Andy, vocês dois sempre tem problemas, nem parecem que estão namorando. Você é minha amiga e eu também sou amigo do Earl, mas não sou também pombo correio pra ficar ouvindo os problemas que um tem em relação ao outro.
- Eu sei, mas é que você é amigo dele e pode muito bem perguntar o que ele acha de mim, por isso que eu vim falar com você – ela fez uma cara meio triste que me comoveu.
- Nem preciso perguntar, ele ama você. Isso qualquer um sabe – e comecei a andar em direção ao arco que levava às escadas.
- Eu sei, mas às vezes parece que ele não mostra isso – ela falou meio chateada.
- Não tenho culpa se ele não gosta de ficar naquela sangria desatada de “AI, EU TE AMO” o tempo todo – falei e comecei a subir as escadas e ela veio do meu lado.
- Pois é, mas isso não faz mal pra ninguém não é? – ela empurrou a porta de sua sala e entrou rapidamente dando um pequeno “tchau” pra mim e eu continuei meu caminho.
Depois de falar com Andy, eu voltei pra sala de aula calmamente. Quando cheguei ao meu andar, o terceiro e olhei para a porta de madeira com a tela de vidro na parte de cima para tudo que estivesse lá dentro fosse visto do lado de fora e tudo estava apagado. Empurrei a porta devagar e não vi ninguém lá dentro; mochilas nas cadeiras e o ar condicionado da sala estava ligado. Larguei a minha mochila na minha cadeira de sempre e vi a de Víctor atrás da minha. Virei-me para a porta para procurar a todos e a escancarei com a mão direita. Saí dando passos curtos e rápidos e vi que a sala da frente estava apagada sendo que um filme estava sendo exibido usando um projetor que fazia a imagem aparecer no quadro branco. Coloquei a mão na maçaneta e senti de novo a ardência na mão, hesitei em abrir a porta e dei um passo pra trás, logo que fiz isso senti que bati em alguém, virei para o lado e tropecei na escada caindo em linha reta. Nesse mesmo momento eu estiquei os braços pra trás, senti um impulso e uma onda de calor e literalmente “voei” até chegar ao final da escada. Não levou mais do que dois segundos, caí com um salto reto espantado com o que fiz. Virei para trás para ver no que eu havia esbarrado, mas eu já tinha certa idéia do que era. O que não. Quem era. Víctor estava no alto da escada me olhando com uma cara normal como se eu o que eu tivesse feito fosse algo simples como descer as escadas. Levantei as mãos e vi que fumaça branca saia delas. Ele desceu dois degraus e falou:
- Qualquer dia me ensina isso, parecem poderes, sei lá – e subiu de novo entrando na sala.
Fiquei ali parado olhando para onde ele estava, assim que eu coloquei o pé na escada olhei para minha mão e dei um berro de profundo espanto com o que vi.