O que tem no seu CTRL + V?

Félix levantou rápido, assustado. Suava muito, por isso a regada branca que o mesmo usava estava com grandes manchas amareladas, provavelmente pela quantidade de ácido úrico que o mesmo havia excretado de seu corpo. Passou a mão pela parte alta de seus cabelos grisalhos, e logo depois pelo resto da cabeça, sentido os outros ralos fios. Ele sempre usava um corte estilo asa-delta, porém no meio da sua cabeça era cacheado e os mesmo lhe cobriam a cabeça.

As veias de seus olhos pulsavam por entre suas duas córneas. Respirava forte, e tinha a pupila dilatada, fazendo com sua íris ficasse quase invisível em conseqüência das várias veias e da dilatação, o que dava a impressão de que todo o seu olho ficara maior. Olhou para os lados e viu Yellow, que procurava algo em sua bolsa. A mulher acha então uma Friend Ball. Ao virar-se, ela se depara com o garoto e sorri para o mesmo, que continua com a mesma cara séria e fechada de sempre. Ela repara os olhos do garoto e o suor anormal, e sua expressão muda de alegria para preocupação.

- Félix, você teve outro mau pressentimento? – perguntou Yellow, aproximando-se do garoto. Estendia um dos braços para passar a mão por entre os cabelos do garoto, que não liga e deixa-a o fazer.

- Sim. – afirmou ele – Sonhei novamente com aquele dia, em que minha visão fora tomada e que toda a melanina escorreu por minhas próprias mãos. – Félix então suspirou – Tudo pelo maldito Josef.

- Não fique assim Félix. – falou Yellow, batendo bem suave na cabeça do garoto, que bateu a sua mão nas mãos da mulher, sem muita força, em um gesto que parecia pedir para aparar. – Você só não coloriu os cabelos por que não quis, e também não usa óculos por que renegou qualquer coisa do tipo.

- Yellow, você se sentiria bem, sabendo que há algo que não lhe pertence em seu corpo? – perguntou Félix, que deixou Yellow um pouco passada – Você gostaria de viver pelo resto da vida em uma cadeira de rodas?

- Mas você não precisa viver em uma cadeira de rodas. – falou Yellow, com os olhos um pouco vagos e entristecidos – Félix, você deve aceitar mais as coisas como são e ainda agradecer por estar vivo.

- Basta! – gritou Félix, jogando no chão também um vaso esverdeado que ficava sobre um criado mudo ao lado de sua cama – Antes o Gary, e agora você. Todos sabemos que nossas vidas não são para ser assim! Meu tio tem progéria, e você é infértil. Eu perco minha visão em quase todos os momentos, e por onde passo, as pessoas me apontam o dedo e me julgam por algo que não sou. Você acha que isso está certo, Yellow? – perguntou Félix, enquanto seus olhos se enchiam d’água. Não conseguia olhar muito bem com a mulher, pois como já disse, perdera um pouco da visão.

O garoto havia tocado em um sentimento profundo da Yellow. Ela nunca poderia dar a luz, nunca poderia tocar em uma criança e dizer que ela era seu filho. Não poderia olhar nos olhos do individuo inocente e dizer eu te amo. Seria para sempre sozinha na vida, e sua geração de família acabaria por lá. Ela então puxou o menino para perto de si e o abraçou com força. Uma lágrima via-se cair de seus bonitos olhos.

- Félix, eu sei como se sente. – falou ela – Creio que acha que tudo na vida é muito sintético, e queria entrar mais em contato com as coisas naturais. – continuou ela, enquanto tentava abrir um sorriso, mas as lágrimas continuavam a rolar – Quando era criança, eu também queria fazer isso. Salvei seu pai e enfrentei Lance, o melhor dos treinadores e também um dos que mais me decepcionou por sua ambição e coração impuro. Acho que isso me fez desejar viver em minha própria fantasia. E aqui estou.

Levantou-se então da cama e saiu de perto de Félix. Pegou sua vara de pescar como sempre fazia e a deixou por cima de seus ombros. Puxou uma mochila que estava sobre seu colchão e a vestiu também. Pegou a Friend Ball que havia deixado sobre uma pequena cômoda que estava no meio do quarto e a lançou para o garoto, que por instinto – já que não podia contar totalmente com a visão – conseguiu a agarrar com a mão esquerda, que tinha uma pequena mancha marrom nos pulsos.

- Uma pokéball, Yellow? – perguntou ele, somente vendo um verde e manchas vermelhas muito desbotadas – Mas, que isso? Uma Safari Ball?

- Não meu querido. – disse ela, lembrando-se do estrago que Félix fez e botando tudo de novo sobre sua cama para varrer os cacos do vaso – É uma Friend Ball.

Rapidamente ela foi até a dispensa, pegou uma vassoura e uma pá catadora de lixo. Voltou então ao quarto, onde Félix encarava as manchas sério. Ela limpou tudo, pegou os restos não-mortais do jarro e as pôs no lixo.

- Félix, eu não poderei deixar que vocês me acompanhem. – falou ela – Sinto que estou sendo seguida, e preciso ir investigar algumas coisas na antiga cidade de Cerulean. . . – Yellow falava devagar, parecia que não queria dizer nada sobre aquilo – Por favor, durma novamente. Creio que suas pupilas já estarão boas quando acordar.

Ela então se vestiu novamente com seus equipamentos, aproximou-se da cama de Félix e beijou a bochecha suada do garoto. Tirou a Friend Ball das mãos do jovem, e a botou cuidadosamente sobre o criado mudo. Balbuciou algumas palavras de adeus ao menino, e foi-se pela porta dos fundos, pois ela carregava sempre uma chave dos locais importantes de Kanto. Félix por sua vez, ficou olhando o tempo passar. Alguns minutos após encarar o teto sem muita precisão por parte de sua visão acabou pegando no sono.

Acordou com a luz do sol batendo em sua face. Agora podia ver tudo de forma clara, novamente. Sun ainda dormia calma, sem preocupações com nada. Foi então tomar uma ducha no sanitário que ficava no mesmo quarto. Ao chegar ao banheiro, sobre o mármore da pia havia um pequeno pacote assinado por Yellow a Sun. Félix decidiu não mexer com aquilo, não era algo seu. Pôs-se então a voltar ao caminho, tomando como sempre seus longos banhos.

Voltou então à parte principal do quarto, enrolado por uma toalha de algodão acinzentada. Buscou em sua mochila outra regata branca, e pôs seu casaco grosso e preto desbotado por cima. Vestiu-se com uma cueca qualquer e trajou-se com uma calça também preta desbotada feita também de algodão como sua acinzentada toalha. Tirou de lá um pequeno pente e foi pentear seus cabelos, deixando os cachos – que ficavam na parte alta de sua cabeça – desenrolados, um pouco para cima.

Puxou de um dos bolsos superiores de seu casaco uma pequena corrente de ouro, e por dentro do mesmo, podia-se ver uma bola também dourada, provavelmente um relógio. Espantou-se então com o horário – confirmando que o objeto não identificado era realmente um relógio – pois já era para estarem partindo.

Cutucou então Sun, que se mexia e balbuciava algumas coisas como “escola”, “mãe” e afins. Quando finalmente acordou, espantou-se com as vestimentas de Félix e com os olhos somente semi-abertos, chutou-o contra a parede, achando que fosse um assanhado. Ao finalmente poder perceber melhor o quem era o que chutara, ela ficou extremamente envergonhada e desculpou-se com o menino, que a perdoou sem maiores problemas.

Pouco tempo passou até que Sun – que também estava no banho – saísse do banheiro. Seus longos cabelos estavam lisos, todos aglomerados para traz. Botou dos brincos de prata, que ficavam pendurados entre suas orelhas e seu pescoço. Usava uma blusa de manga longa rosa claro por baixo e uma branca de estilo baby-look por cima. Estava com uma calça também branca com alguns enfeites rosa, que iam até as longas botas da garota, sumindo ao misturar-se com as meias também brancas.

Ela abriu o pacote de Yellow, e dentro dele havia um relógio Champion de cores branca, transparente e azul bebê. A garota adorou, tanto que foi a primeira coisa que fez ao ver foi botar. Havia também um pequeno bilhete da líder de ginásio e uma foto dela ao lado de Green, ou Gary, como gostava de ser chamado, Red e Blue.

Sun leu o bilhete em voz alto. Yellow antes de qualquer coisa falou que havia ensinado ao Dunsparce da menina o golpe Dig, pois ele seria muito útil ao cruzar o Deserto das Ilusões. Implorou, exatamente com essas palavras, que ela desse mais atenção ao pequeno Pokémon, caso contrário, que o largasse para ser feliz. O resto eram somente palavras de consolação e desejos de boa sorte ao passarem no deserto.

Andaram um pouco pelo laboratório, até que finalmente estavam na saída do mesmo. Lá, Gary tomava como sempre uma longa xícara de café e lia seu jornal semanal. A matéria da capa, como era de se esperar, foi a operação falha da Black Garden e a Master Ball.